(por Luciana Priscila Carmo e Fernando Martins Pereira da Silva, ambos do CJBH e CJMG - Coletivos Jovens de Meio Ambiente de Belo Horizonte e Minas Gerais)
Belo Horizonte, 19 de outubro de 2009
Ocorreu, nos dias 16, 17 e 18 de outubro de 2009 a 2ª Conferência Municipal de Cultura de Belo Horizonte. A programação prevista era abertura na noite do primeiro dia, palestra e grupos de trabalhos no segundo dia e plenária final no terceiro dia. Tivemos até um número razoável de inscritos, mais de 900 pessoas, divididos pelas categorias de servidor público, trabalhador da cultura, usuário da cultura e representante de entidade.
Dos inscritos, a maioria tinha entre 16 e 29 anos, ou seja, eram jovens. Mas apesar disso e da juventude representar mais de 30% da população brasileira e ser a fase da vida maior responsável pela formação dos cidadãos de hoje e de amanhã, havia no regulamento municipal, em seu Art. 32 sobre a eleição dos delegados, um inciso III, que dizia “em caso de empate será considerado eleito o candidato de maior idade”. Um dos resultados disso foi que tínhamos a oportunidade de termos 3 delegados jovens dos 16 totais para a sociedade civil, mas acabamos perdendo em um empate, ficando apenas com uma minoria de delegados jovens representando uma maioria da população, que é quem mais necessita das atenções das políticas públicas, inclusive as culturais.
Comecei então a fazer uma série de reflexões, após ouvir vaias de uma parte da plenária e palavras desanimadas(doras) dos jovens ali presentes quando fui na frente da plenária defender a juventude contra os ataques e os descasos da comissão organizadora, sem um jovem sequer e do regulamento criado também sem participação de jovens. Um rapaz de 32 anos, conhecido meu chegou até mim e disse que aquilo que eu fazia não adiantava, a gente se exaltar não adiantava, nós querermos falar e sermos ouvidos não adiantava. Então eu disse a ele, que eu gostaria de falar não preocupado se iria adiantar ou não, mas por este ser um direito de todo cidadão brasileiro, eu tinha este direito, de liberdade de expressão tão negado a todo momento, até mesmo em uma conferência de cultura, cujo princípio é a diversidade, seu reconhecimento, seu respeito e sua liberdade. Não agüentei ficar quieto ao ver os poucos jovens que após horas de trabalhos desgastantes ali ainda estavam presentes dando o seu voto de confiança nos mais velhos enquanto pouquíssimos jovens (16 a 29 anos) e pós- jovens (acima de 29 anos) confiavam seu voto à juventude.
Uma outra garota, de 30 anos, veio me questionar se eu queria tirar as últimas oportunidades de alguns sábios maestros da nossa cultura participarem deste processo tão importante para eles. Eu disse que não era esta minha intenção, apesar da proposta e ultrapassado critério de desempate que menciono acima ser exatamente agir com parcialidade prejudicando sempre os mais novos, neste caso os jovens. Era uma incoerente demonstração do não reconhecimento dos jovens enquanto protagonistas e os mais capacitados para representar as várias diversidades da nossa cultura, por estar sempre entre o novo e o tradicional, unindo as duas correntes, que pra muitos dos pós-jovens ali presentes seriam contrárias ao invés de complementares. Digo incoerente por estar convicto de que boa parte desses pós-jovens tiveram seu despertar cultural e/ou político ao longo sua juventude, seja durante os 20 anos de ditadura militar, seja na época subseqüente da campanha pelas diretas já e do movimento dos caras pintadas, seja durante o avanço da corrupção em todos os governos que após vieram. Será que não estão fazendo exatamente o que faziam os seus (nossos) opressores? Desmobilizando a juventude e impedindo que a mesma protagonize a nossa história, ou seja, seguindo ao lado e unindo-se a todos e não seguindo atrás, acorrentados às sombras dos que se julgam mais capazes? Além de tudo isso, nenhuma das quase 100 propostas aprovadas se referia diretamente à juventude, nem sequer foi falado do plano nacional da juventude ou do estatuto da juventude, que possuem várias diretrizes referentes à questão cultural.
No nosso entendimento e de algumas outras pessoas presentes, esta conferência foi totalmente manipulada(dora) e desorganizada(dora), deu-se muito tempo para os intervalos, nos primeiros dias e por isso tivemos que correr com os trabalhos, tanto nos GTs, quanto na plenária final, ficando muitos inclusive sem almoçar. Apesar de estarem previstos no regulamento, não houve momentos verdadeiros de diálogo porque éramos, a todo o momento, pressionados pela organização devido ao tempo curto e à necessidade das definições. Ou seja, o processo não fluiu, ele desceu como uma enxurrada por nossas gargantas, sendo totalmente atropelado, principalmente por quem deveria zelar pelo seu bom, justo e democrático andamento. Além disso novas emendas eram ditadas a todo tempo “completando” o regulamento oficial.
Outro problema verificado foi a desconfiguração de várias propostas geradas nos GTs quando foram levadas para a plenária. Segundo um dos representantes da sociedade civil na comissão organizadora, foram feitas algumas modificações de sistematização, como aglutinação de propostas semelhantes, exclusão de propostas impertinentes e redistribuição de propostas entre os 3 âmbitos (municipal, estadual e federal) trabalhados pela conferência. O meu questionamento é seguinte: quando alguém propõe alguma coisa, este se torna responsável por aquela proposição, concordam? Como então alguém que se diz sistematizador pode se sentir no direito de mudar totalmente a estrutura e o significado desta proposta, que nem é de sua autoria?
Como exemplo efetivo da descaracterização de propostas colocamos o fato ocorrido na proposta indicada pelo GT da Sala 1 do Eixo 3 - Cultura e Desenvolvimento Sustentável, em que sugerimos coletivamente (e literalmente) em âmbito municipal o seguinte : “Criação de um bônus de incentivo às empresas que destinem recursos diretamente para o Fundo Municipal de Cultura (Acompanhado de selos de sustentabilidade cultural)”. A proposta foi apresentada à Plenária Final totalmente distorcida após a “aglutinação” (ou “sistematização”), propondo assim selos de reconhecimento para Projetos que através de Leis de incentivo à cultura realizassem ações de arte-educação nos âmbitos municipal, estadual e federal.
Outros questionamentos pertinentes se referem à exibição das propostas durante a plenária final, que eram colocadas em uma tela de projeção e não tínhamos como comparar propostas após serem lidas pela mesa, ou seja, não tínhamos uma visualização completa do conjunto das propostas. Cabe lembrar que cada participante votava indiscriminadamente quantas vezes quisesse, pois não havia um critério claro no regulamento (e se havia foi mal entendido e desrespeitado) e tínhamos que acreditar na palavra da pessoa designada pela organização para fazer a contagem dos votos em um Ginásio enorme e repleto de pessoas. A acústica do local não deixava o som claro e a todo o momento ouvíamos pessoas reclamando de não terem entendido as propostas. As abstenções não eram contabilizados como votos contrários às opções propostas. A possibilidade de se apresentar apenas um destaque e um parecer a favor e outro contrário era insuficiente diante das muitas reivindicações, sendo então descumprida esta norma sem que se estabelecesse alternativa melhor. E ainda, os textos que especificavam setores da cultura foram transformados em textos genéricos.